Foto: Renan Mattos (Diário)
Os 35 alunos também não contam com banheiro na escola de Arroio Grande. Há apenas uma latrina improvisada no mato
A Escola Estadual Indígena de Ensino Fundamental Augusto Ope da Silva, em Santa Maria, carrega no nome uma simbologia do que é considerado o Brasil profundo. A instituição fica no distrito de Arroio Grande, zona rural do município, e atende à tribo caingangue. Até o fim do ano passado, a escola funcionava em terreno particular na Rua João Batista da Cruz Jobim, perto da Rodoviária. No local, viviam 20 famílias, somando cerca de 70 pessoas. A saída deles se deu porque os donos do terreno solicitaram a área à prefeitura.
O Executivo, então, propôs que os proprietários comprassem uma área para realocar os indígenas e, assim, perdoaria os débitos referentes ao IPTU do terreno. Porém, a mudança de endereço, conforme os indígenas, mostrou-se em "um presente de português". Desde fevereiro, eles passaram a morar perto da Estrada Municipal de Canudos, e as dificuldades - que já eram presentes na realidade indígena - se agravaram. Quem afiança o relato do drama vivido pelos índios é a diretora da escola, Isabel Cristina Baggio.
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A diretora afirma já ter solicitado à companhia RGE a ligação de uma rede de luz para a escola. Desde 26 de fevereiro, quando se começou o ano letivo, os 35 alunos dos turnos da manhã e da tarde sofrem com a falta de estrutura que assegure o direito básico à educação. As aulas são no escuro.
O carro-chefe dos problemas é a falta de luz. Conforme a diretora, a RGE tem exigido mudanças que estão fora do alcance da escola, como uma entrada padrão que contemple todas moradias da aldeia, estimada em R$ 15 mil. Por mês, a Augusto Ope da Silva dispõe de R$ 1,2 mil para a sua manutenção.
Sem luz, também não há água nem banheiro. O acesso à estrada é de chão batido e, quando chove, o transporte escolar fica prejudicado. Vizinhos da instituição cederam espaços de suas casas para abrigar a geladeira e os freezeres com os alimentos, além de fornecer água.
- Caso não tivéssemos tido essa ajuda, os alimentos para a merenda estragariam - conta.
ALÍVIO
Segundo Isabel, seis alunos da aldeia, matriculados no Ensino Médio, estão sem transporte para estudar na Escola Estadual Margarida Lopes, em Camobi. O serviço durou até maio, custeado com ajuda de uma ONG, da comunidade e dos professores.
Na última sexta-feira, a 8ª Coordenadoria Regional de Educação (8ª CRE) sinalizou à direção que conseguiu recurso para a retomada do transporte. Ainda assim, os seis alunos terão de caminhar 3,5 km da aldeia até a parada de ônibus, um percurso a pé de 45 minutos.
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18 FAMÍLIAS CAINGANGUES ENFRENTAM DIFICULDADES
Além da ausência de energia elétrica, outra situação preocupa os indígenas: a extensão de uma rede de água que chegue até a aldeia e à escola. A situação apenas não é mais grave porque moradores próximos da aldeia viabilizaram a colocação de torneiras na saída de suas propriedades para aliviar o problema.
- A gente só consegue beber, cozinhar e tomar banho com a ajuda dos moradores que nos dão água. Mas é bem ruim tudo isso - desabafa Joel Amaro, 28 anos, da tribo caingangue.
Os indígenas até iniciaram a escavação de um poço, com apoio da prefeitura e da Emater, mas faltaram tubos. A Corsan tem um projeto sendo elaborado para contemplar a comunidade indígena (leia mais ao lado).
O Ministério Público Federal (MPF) acompanha a situação desde a mudança da aldeia para o local. Há um mês, a procuradora da República Bruna Pfaffenzeller foi procurada pela direção da escola e pelos índios relatando os problemas. Ela encaminhou pedidos de esclarecimentos e de providências à RGE, à Secretaria Estadual de Educação, à 8ª CRE e à direção da escola.
- Se eventuais entraves eram admissíveis no começo do ano letivo, eles, agora, não são mais cabíveis para qualquer tipo de justificativa - afirma Bruna.
Foto: Renan Mattos (Diário)
Joel Amaro, 28 anos, busca água na casa de vizinhos, já que não há abastecimento na aldeia caingangue de Arroio Grande
A ESTRUTURA DA ESCOLA ESTADUAL INDÍGENA AUGUSTO OPE DA SILVA
- Criada em 2013, trabalha com alfabetização bilíngue, em português e em caingangue
- 10 professores trabalham no local. Sendo 4 caingangues
- Atende 35 alunos da pré-escola, anos iniciais e finais do Ensino Fundamental e EJA
- É de madeira, sem luz, água e banheiro. Há uma latrina no mato
- A escola fica em uma área de 22 hectares no distrito de Arroio Grande (a 10 km de Camobi)
- Há 6 anos, a direção reivindica ao Estado um prédio de alvenaria com laboratório de informática, refeitório e biblioteca
- Atualmente, conta com duas casas de madeira. onde ainda estão guardados computadores à espera de energia e os livros
O QUE DIZEM OS RESPONSÁVEIS
"Há um projeto sendo elaborado para contemplar a comunidade indígena. Porém, em função do perfil topográfico, o terreno onde estão apresenta uma complexidade maior. Por estar em um ponto muito alto, serão necessários 7 km de tubulação, duas estações de bombeamento e dois reservatórios. No caminho, ainda há um desnível geométrico de 100 metros. Mas a Corsan está atenta e sabedora dessa demanda"
José Epstein, superintendente da Corsan
"Há menos de um mês, a prefeitura fez uma intervenção na Estrada de Canudos, com empedramento e patrolamento da via. No entanto, choveu vários dias depois disso. Na semana passada, a equipe atuou nas proximidades, no acesso à pedreira de Arroio Grande. A Estrada de Canudos entrará no cronograma de melhorias nos próximos dias. No começo deste ano, a prefeitura, em conjunto com a Emater, cedeu três tubos de concreto, com diâmetro de 1m25cm cada, que teriam sido usados no referido poço do assentamento indígena. Ocorre que, devido à profundidade, foram necessários mais tubulações. No momento, a prefeitura não tem orçamento disponível para comprar mais tubos, mas avalia alternativas"
Prefeitura de Santa Maria
"A RGE vai enviar um equipe técnica ao local para averiguar as condições técnicas e de segurança para a ligação de energia na escola Augusto Ope da Silva."
RGE, concessionária de energia